quarta-feira, 12 de outubro de 2011

A harmonia do caminho...

No universo das artes marciais orientais, nomeadamente nipónicas, o praticante depara-se com diversos caminhos, vias, estilos, de onde provêm os vocábulos michi (mitchi, o mesmo que dô, doo, dou... caminho) e kai (escola, estilo).
Podemos simplificar e, num contexto de análise da tensão corporal, considerar essa miríade de caminhos divididos em duas grandes vias: os estilos líquidos (ou internos) que baseiam toda a prática na descontracção, considerando o corpo humano semelhante à água (mizu)... e os estilos sólidos (ou externos) que usam constantemente técnicas e movimentos bastante contraídos, como se a constituição física do oponente (em combate) devesse ser encarada como uma pedra ou pedaço de madeira.
Lao-Tseu, fundador do Taoismo
Como é típico das abordagens dialécticas (perspectiva Yin-Yang), dificilmente encontramos os exemplos puros expostos, sendo que a maior parte das vezes os estilos não são exclusivamente internos ou externos... mas sim compromissos das duas qualidades. Quando denominamos uma escola por externa ou interna referimo-nos assim à preponderância qualitativa desses factores. Estilos há entretanto em que não é muito fácil qualificá-los quanto à tensão-descontracção, à dureza-flexibilidade, respiração forte ou natural, requerendo tal desiderato uma explicação mais detalhada.
Cada praticante escolherá a sua via, o seu modo de se sentir harmonizado com o todo e sobretudo consigo mesmo. Para isso talvez seja conveniente experimentar várias escolas e manter uma mente aberta.

1 comentário:

  1. A Harmonia do caminho é um ajustamento ou ordem de elementos, ajustamento, encaixe, articulação, proporção. Desde sempre se comparou a harmonia musical à harmonia cósmica, a universo entendido como um sistema de elementos diversos e contraditórios. Alguns, como Heráclito proclamam mesmo que a bela harmonia nasce das coisas contrárias e tudo brota da oposição. É desta ideia do tecer os contrários que nasce a própria reflexão da política, nomeadamente em Platão. Com efeito, as coisas políticas, as coisas da religião e as coisas do direito, todas procuram uma ordem comum, a ordem que se opõe ao caos, um equilíbrio que sempre precisou de uma espada e de um fiel, para poder ser harmonia ou mistura de contrários. Porque nunca houve nenhuma sociedade em que todas as regras fossem espontaneamente cumpridas, porque sempre foi precisa uma heteronomia, um poder entendido como a mistura da força com ideias, capaz de punir os prevaricador. Onde, em vez de um bloco monolítico hierarquista, tenta imitar-se o pluralismo e a flexibilidade da harmonia cósmica. Sem os valores, a ordem política não passaria de mera facticidade, não possuindo sentido nem íntima ordenação. Com os valores a ordem política passa a ser uma espécie de dinâmica de distintos à procura de harmonia, onde as bipolaridades e as antinomias são exigências vitais. A politicidade, com efeito, é poder mais liberdade, governabilidade mais participação. A polis não pode ser pequena demais nem grande demais. Tem de ser uma unidade que não desfaça harmonia desses contrários que são o poder e a liberdade.

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